“Enxada” (projecto experimental lúdico)
AUTORA: Raquel Balsa
DATA: 2021
TIPOLOGIA: Jogo
DIMENSÕES: Tabuleiro 45×65 cm, caixa fechada 37x23x5 cm / caixa aberta 46x37x2,5 cm, peças do tabuleiro com dimensões variáveis, maço de cartas 9,5×14,5 cm. .
MATERIAIS: Madeira, papel, papel impresso, técnicas de pintura manuais mistas.
N.º DE INVENTÁRIO: MF.2021.013
N.º DE CATÁLOGO: #040
Memória Descritiva
Não falamos com uma só linguagem. “A língua das palavras não che ga para tudo”podemos ler no livro “Eu, o povo” de Multimati Barnabé João (“voz individual que corporiza a voz colectiva”). Precisamos dos números e dos desenhos: “As três línguas juntas é que são a língua verdadeira do Homem” (Mutimati). A forma de dizer Rio, pensar Rio, retratar mais ou menos Rio é sermos também rio, em diversas linguagens incluindo a do rio. E ainda assim o Rio escapa-nos.
Aprendemos a escrever usando letras, pequenas peças que formam palavras. Mas para dizer precisamos de mais. Ou de menos. As letras são primeiro formas. Desdobrámos as letras em formas muitas vezes amendoadas como as que nos envolvem, líricas, oníricas, telúricas, nas obras de António Quadros (são 8 módulos os que usámos, duas vezes os quatro elementos). Em formas que dão formas. Nas obras de António Quadros há formas que se repetem,
que se adivinham antes, dentro e atrás das formas; neste nosso abecedário encontramos estas formas para redescobrir e com elas talvez sementes, o autor, enxadas para o pensamento, para a terra, para viver se encontrem. E para este encontro de linguagens uma das melhores formas é brincar. Brincar aumenta a possibilidade de tentável comunicação.
Que não nos faltem linguagens porque nas palavras às vezes faltamos. Mas mesmo quando fraquejam palavras são por vezes início e foi assim o desta enxada*:
Um pequenino(a), um velhinho(a), um operário(a), um estudante, um mi grante, um peregrino, uma andorinha, um moinho de vento, um cientista, um investigador da nanotecnologia, são débeis, um a um, separados da natureza, são menos do que aquilo que são, na ação operativa são nada, quase nada, mas entrelaçados e abraçados nos quatro elementos da Natureza: água, ar, fogo e terra, são promessa por cumprir, são uma força de semente, na magreza anunciam a abundância, no arado a doirada seara, no revés o retorno ao bem estar.
Quem é o maior?
A obsessão do maior é a sede mais nefasta: estiola.
É a pergunta de quem morde na pequenês. Se o maior acontece, é o que importa, não interessa que seja.
A enxada, o anzol, o martelo é maior que o livro? O livro é maior que a enxada?
A prática confirma a teoria, a teoria orienta a prática.
A enxada cava o ninho à semente, o livro “forja a inteligência da mão”.
Que diz a inteligência à mão?
Que dados fornece a mão à inteligência?
Não perguntes: Quem é o maior?
Interroga: O que fala cada coisa?
Raquel Balsa e Adriano Sousa
*tipos apresentados desenhados conforme elementos manuscritos do autor
Referências:
MUTIMATI, Barnabé João. Eu, o povo. Livros Cotovia, 2008.
A Falsidade Explicitada
António Quadros, autor multifacetado, artista-poeta-…, pedagogo de causas nacionais, com fibra, talento e tremor, vertigem do presente e ansiedade do futuro a acontecer, é defensor extremo da força que jorra em cada um, integrada no todo em interação com o que envolve e nos toca. Os vegetais, os animais… os quatro elementos fundamentais do universo também são parceiros do nosso caminhar para a liberdade (que sempre nos transcende). Liberdade não é individuação. A expressão individual é uma parte que combina com outras… do Universo em construção. Liberdade é compromisso gerador de vida. Até a Morte vale na perspectiva de Vida renascente.
Eu sou nós — E nós é uma criação sempre em ebulição.
Esta peça foi criada para o Museu do Falso e teve como Parceiro Institucional