Cartaz “Digressão Universal do Circus Vaccaensis”

TIPOLOGIA: Cartaz
TÉCNICA: Ilustração
DATA: 2012
N.º DE INVENTÁRIO: MF.2012.009

Memória Descritiva

Definida a ideia da criação de um cartaz para um Circo de Aberrações, o passo seguinte foi, inevitavelmente, o da pesquisa: como se apresentavam os cartazes no séc. XIX? Qual o traço, a composição e a cor? As descobertas foram aplicadas em grande parte no desenvolvimento deste trabalho.

Como elementos principais temos as cabeças de carta, claro, com o Beirão ao centro, o Homem-Lobo e a Mulher-Barbuda nas laterais. As figuras apresentam-se bastante detalhadas, mas as suas feições são exageradas e proporções estão desequilibradas. Já as cores fortes e variadas eram um traço comum para a época. No topo, uma filactera anuncia o nome do circo e, em baixo, tal qual um patrocínio, faz-se a menção ao Elixir do Dr. Huxley.

Para o desenvolvimento deste cartaz misturaram-se várias técnicas: os desenhos foram feitos a caneta e tinta-da-china, já a cor essa foi acrescentada digitalmente. Finalizada a composição, o cartaz foi impresso em papel fino e frágil (como se seria de esperar) e envelhecido com café, conferindo-lhe um tom acastanhado e desgastando os tons vivos. Para terminar, o papel foi vincado e rasgado em partes, simulando o seu uso descuidado e remendado com fita-cola, prática comum de um português desenrascado.

A Falsidade Explicitada

Os artistas performativos (saltimbancos, malabaristas, prestidigitadores, etc.) são de antanho um dos grandes elementos necessários ou pelo menos notórios na memória colectiva e na documentação existente, nomeadamente quando se trata de Feiras ou Mercados que pudessem atrair grande número de pessoas (por exemplo a Feira de S. Mateus, no espaço viseense) e nas grandes celebrações, na historiografia denominada de “Festa” (as efemérides reais – nascimentos, casamentos, etc. – as celebrações religiosas mais importantes, como o “Corpus Christi” – que em Portugal se celebra em 2012 pela última vez no seu dia de direito, embora a promessa seja a de haver apenas uma suspensão por 5 anos).

A noção de “aberrações” ou curiosidades, é por seu turno um elemento igualmente antigo, embora se relacione com as noções de museu e de colecção, pelo menos desde os alvores da Idade Moderna, com as “Wunderkammer” ou “Kunstkammer” (Gabinetes de Curiosidades, pertencentes a ricos proprietários, que procuravam no espírito de conhecimento do Mundo que então se abria à Europa pelas descobertas marítimas e novas rotas comerciais, possuir os mais raros e excêntricos exemplares de tipologias várias). A nível do Ser Humano, é de notar por exemplo, a prática de rapto ou convite – digamos “transporte” – de índios, pigmeus, etc., desde as suas áreas geográficas de origem até às cortes dos navegantes que com eles entravam em contacto – ou a questão dos anões nas cortes europeias dos séculos XVI, XVII e XVIII e com grande destaque no caso da pintura de Diego Velasquéz; ou então a verídica história de Pocahontas que a Disney tornou mainstream.

A criação dos Circos, tal como os conhecemos e em particular com o cariz de elementos volantes entre localidades, é por sua vez um marco na história americana do século XIX – e aí se baseia o Circus Vaccaensis (de Vacca, um dos nomes que se dizia ser o de Viseu na antiguidade ou sua fundação, e bastas vezes referido nessa condição pelos autores: vide por exemplo MARANHÃO, Francisco dos Prazeres – Diccionario Geographico Abreviado de Portugal e suas Pocessões Ultramarinas. Porto: Casa de Viuva Moré, 1862.). Embora o conceito de circo contemporâneo seja anterior ao século XIX, é nesta centúria que assume a matriz que se lhe identifica, em particular com P.T. Barnum, cuja nomenclatura de “Maior Espectáculo do Mundo” é por ele cunhada. Igualmente com P.T. Barnum se elaboram as prmeiras grandes estratégias promocionais vinculadas aos cartazes, cujos exemplares remanescentes são extremamente valiosos e procurados por colecionadores.

No “Circus Vaccaensis”, faz-se igualmente menção a duas das figuras clássicas dos circos de aberrações: a mulher barbuda (que em Viseu, se conota com um dos mais famosos retratos do dito Pintor Gata, e actualmente exposto no Museu Grão Vasco) e o Homem-Lobo, cuja referência concreta surge do Lobisomem mas que no caso dos circos itinerantes parece ser, segundo os especialistas médicos, uma condição denominada Hipertricose, que criava um excesso de pilosidade no paciente e de cuja situação há registos já no século XVII. Já a figura do Beirão se assume pela descrição inicial do Historiador Oliveira Martins, que, ao introduzir a sua História de Portugal (1879), elabora uma referenciação “tipológica” dos habitantes de cada região do país, através do clima e geografia a cada uma dessas regiões associada – eventualmente partindo de uma leitura psico-antropométrica dos vários tipos populacionais.

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