A Corneta de Rei Ramiro II

DESIGNAÇÃO: Corneta cerimonial
DESCRIÇÃO: Objecto de formato cornucopial, decorado com duas faixas aprumadas e paralelas, preenchidas por fímbria geométrica e elementos pseudo-cruciformes, com cogulhos ao centro. Junto ao bordo, muito desgastado, renque de motivos estilizados e vermiculados, simulando lambrequim de bilhetas. Apresenta vestígios de policromia. Pelas suas características e material utilizado (terracota em vez de madeira ou marfim) deduz-se que seria um objecto simbólico e/ou cerimonial.
MATERIAL: Terracota
DATAÇÃO: Período alto-medieval (séc. X)
N.º DE CATÁLOGO: #025
Material: Terracota
LOCAL DA DESCOBERTA: Moçâmedes, Viseu
40°43’52.03″N / 8° 0’52.43″W
DIMENSÕES: Comprimento: 39,5cm
Diâmetro maior: 14cm
Diâmetro menor: 3,5cm
PROPRIEDADE: Rúben Filipe Marques

Contextualização

“No passado dia 22 de Maio, uma descoberta acidental transformou um jovem agricultor residente em Moçâmedes (distrito de Viseu) num verdadeiro herói local e reacendeu o debate no seio da comunidade científica, onde há muito se vem questionando se as lendas do Rei Ramiro terão algum fundamento histórico. Quando tentava remover umas pedras do seu terreno, situado perto da Capela da Senhora da Agonia, deparou com um conjunto de objetos semienterrados que, segundo afirma, apenas «pareciam ser mais lixo e entulho». Uma peça, contudo, despertou a sua atenção e levou-o a contactar Rufino Pereira, um historiador local que prontamente a identificou como sendo uma estela funerária do período medieval.

Uma posterior prospeção pelo terreno permitiu identificar ainda os vestígios de um grande túmulo de pedra e uma corneta de terracota, que os habitantes da região associaram de imediato ao instrumento de som utilizado pelo Rei Ramiro II na lenda de Miragaia. «A memória popular sempre associou a figura deste Rei ao lugar de Moçâmedes» – avança Rufino Pereira. «Não devemos tirar conclusões precipitadas, mas a verdade é que as descobertas dos últimos dias parecem confirmar que ele, não somente viveu, como foi sepultado aqui.»

Com a chegada de uma equipa de arqueológos da Universidade de Trujillo, que irá coordenar uma campanha de escavações arqueológicas mais exaustiva, as peças foram enviadas para um laboratório que procedeu à sua datação por carbono 14. Ficou confirmado que pertenciam a finais do séc. IX / meados do séc. X. O mais surpreendente, contudo, foi que durante os trabalhos de limpeza e restauro das mesmas se descobriu um pequeno pedaço de papiro, manuscrito, escondido numa minúscula concavidade da corneta. Apesar do seu avançado estado de degradação, já foi possível efectuar uma leitura parcial do documento, que se apresenta como uma listagem de bens.”

In Jornal da Beira Dão, 4 de Junho de 2012, pág. 38

DESIGNAÇÃO: Arrolamento de bens (fotografia)
MATERIAL: Papiro
DATAÇÃO: Período alto-medieval (final do séc. IX – início do séc. X)
DIMENSÕES: Comprimento: 11,7cm; Altura: 7,4cm
LOCAL DA DESCOBERTA: Moçâmedes, Viseu. 40°43’52.03″N / 8° 0’52.43″W

Documento manuscrito em pergaminho, descoberto enrolado no interior da corneta cerimonial. Apresenta um avançado estado de degradação, tornando impossível a leitura completa e indubitável de todos os caracteres. No entanto, o texto traduzido até ao momento permitiu compreender que se travava de uma listagem de objectos, ligados à infância de um membro destacado da nobreza peninsular. Na quarta linha, uma referência ao nome “Ordonho” torna plausível a associação com o Rei Ramiro II, que se pensa ter vivido alguns anos nesta região de Viseu.(Nota: Ordonho II foi suserano de Galiza e de Leão e pai de Ramiro II).

– Objecto 1: segundo a descrição, seria um objecto de configuração alongada composto por dois elementos distintos: o primeiro apresentando duas aletas laterais (percorridas por uma faixa de cabeças-de-prego entrelaçadas) e emergindo sobre um cabo cilíndrico rematado por um polígono arredondado, ladeado por frisos bojudos intercalados por anéis de faces lisas. O segundo elemento, mais comprido mas com afunilamento gradual até atingir 1/3 da largura que apresentava no arranque, junto a um nó em forma de micro-urna, desenvolve-se numa lâmina de madeira com alteamento central compósito e termina numa espécie de frontão curvo com arco elíptico peraltado. Após estudos comparativos, presumiu-se tratar de uma espada de madeira.

– Objecto 2: tabuleiro de jogo, composto por um bloco paralelepipédico de pedra com metade dos cantos chanfrados, e os restantes em forma de concavidade tronco-cónica acentuada de faces oblíquas e arestas proeminentes (ou seja, partidos). Apresenta sete linhas verticais e apenas seis horizontais (ou vice-versa, consoante a perspectiva de visão) conjugados numa multiplicação de ângulos rectos e intersecções geométrico-cruciformes, com quadrados enquadrados em outros segmentos quadrangulares maiores. Corolas de berloques e motivos fitomórficos decoram os enxalços inferiores, sendo que a moldura superior é depois composta por faixa de godrões.

– Objecto 3: encontrando-se na parte mais degradada do manuscrito, esta descrição apenas menciona “umas travessas de madeira com (…) de javali”. Os arqueólogos parecem não ter dúvidas que se trata de um cavalo de baloiço, apresentando crina de pelo de javali e patas em meia-lua, com uma cela de couro lavrada a fio de prata.

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